Albin Volte


Faleceu no dia 26, em Paris, o cientista francês Albin Volte, que integrou um grupo de jovens cientistas franceses que participaram de um estágio de serviços civis em troca de serviço militar do Estado francês.
Albin havia completado 82 anos em 2 de junho último, tendo nascido em Saint-Bresson, no Gard, filho de agricultor e uma professora primária.  Seu talento para ciências e matemática levou-o a receber uma bolsa para estudar o ginásio em Montpellier, de onde seguiu para o Lycée Louis-le-Grand em Paris, e depois para o ingresso na École Normale Supèrieure, onde se graduou em Matemática. Em seguida, realizou o doutorado para a área da Física de Partículas. Com a pós-graduação nessa disciplina concluída, ele planejou realizar o serviço civil no Canadá.
Entretanto, o físico brasileiro José Leite Lopes (1918-2006), já exilado na França, perseguido pela ditadura militar, sugeriu que ele trocasse o Canadá pelo Brasil para realizar este serviço no Centro Brasileiro de Pesquisas Física (CBPF), sediado no Rio de Janeiro, do qual Leite Lopes havia sido um dos fundadores em 1949. A proximidade entre o português e a língua occitana, falada pela sua família no sul da França, também contribuiu para a decisão pelo Brasil. Desse modo, em 1970, desembarcou no Brasil o jovem físico francês, Albin Volte.
A presença de Volte no Brasil, naquela ocasião, lhe proporcionou a consciência de um dos piores momentos do regime militar instalado em 1964, onde especialmente após a edição do Ato Institucional número 5, os brasileiros foram submetidos à um período de terrorismo de Estado, privado de liberdades políticas e de democracia. De volta à França, ainda sob o influxo dos ventos dos protestos de maio de 1968 e contra a guerra do Vietnam, já como pesquisador do Centre National de Recherches Scientifiques (CNRS), o que na França é uma carreira profissional própria. Volte canalizou essa consciência para a atividade sindical entre os pesquisadores e para a organização da solidariedade aos brasileiros perseguidos pela ditadura.
No âmbito da solidariedade aos brasileiros, Volte foi um dos criadores do Comitê França-Brasil, tendo sido um dos seus principais animadores, junto com Étienne Bloch, Michel Paty e Rémy Lestienne. O comitê sobreviveria aos piores tempos da ditadura, de modo que a continuada atividade de Volte nesse organismo levou-o a receber em solo francês, um jovem líder sindical brasileiro em ascensão política, atuando como seu tradutor. Tratava-se de Luis Inácio Lula da Silva, mais tarde fundador do Partidos dos Trabalhadores (PT) e agora em seu terceiro mandato como Presidente do Brasil (2023-2026). Volte também se empenhou na solidariedade aos líderes políticos brasileiros exilados na França, como os comunistas João Amazonas (1902-2002) e Renato Rabelo, ou mesmo na Argélia, como Miguel Arraes (1916-2005).
Estas relações de solidariedade com brasileiros fizeram Albin Volte retornar ao Brasil como parte de suas atividades políticas. Assim é que ele está no país, em março de 1987, na posse do Governador eleito de Pernambuco, Miguel Arraes, e em 1992, no congresso do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Estas relações seriam ainda mais intensificadas, incluindo agora viagens familiares a Goiás, relacionadas à sua segunda família, fruto do casamento com a brasileira Maria D’Austria Vieira Volte. Como ironia da história, recentemente, o filho mais velho do segundo casamento, Rodolphe Vieira Volte, foi preso em Paris por ocasião das manifestações contra a reforma da previdência social. Dessa vez, foram as lideranças políticas brasileiras, em 2023, que acionaram o Itamaraty para expressar preocupação e solidariedade com o jovem franco-brasileiro, fechando assim um círculo, que Albin Volte havia iniciado há mais de meio século.
Olival Freire Jr.
Universidade Federal da Bahia (UFBA)

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