26º Foro de SP: Unidade anti-imperialista em defesa da Integração Regional


Por Wevergton Britto

Com a presença de cerca de 300 delegados de partidos e organizações políticas de países de todo o continente americano, além de representantes da Europa, Ásia e África, o 26º Foro de SP foi realizado de 29/6 a 2/7 em Brasília com grande êxito e clima de unidade, sob a consigna “Integração regional para avançar a soberania da América Latina e Caribe”. O presidente Lula, presente na abertura do evento, na última quinta-feira (29), fez um memorável discurso, onde, entre outras coisas, ressaltou a importância da unidade das forças de esquerda. Lula relembrou seus encontros com Fidel Castro, ocasiões em que o inesquecível líder revolucionário não deixava de lhe externar suas críticas, embora, em público, suas palavras fossem sempre de elogios. A conclusão de Lula é de que “amigo age assim”, faz pessoalmente as críticas que julgar necessárias, mas não em público, onde elas podem servir de arma para os adversários. O valioso alerta do presidente brasileiro serviu de orientação concreta ao desenvolvimento dos trabalhos do FSP e fortaleceu a unidade das correntes progressistas latino-americanas reunidas em Brasília. O 26º FSP prestou homenagem a um dos seus fundadores, Marco Aurélio Garcia, falecido em 2017 e declarou, em sua Resolução Final, a República de Cuba “Patrimônio Universal da Dignidade”.

FSP: Uma valiosa obra de engenharia política

No ato de abertura, Lula, ladeado pela presidenta do PT, Gleisi Hoffmann, e pela presidenta do PCdoB, Luciana Santos. Ao lado de Gleisi, a secretária-executiva do Foro de SP, Mônica Valente

O 26º FSP só mereceu, da mídia hegemônica, uma escassa cobertura marcada pela arrogância de determinar o que é ou não “democracia” a partir dos critérios de uma visão reacionária (falaremos mais sobre isso na nota “Sobre o conceito de democracia”). Deixaram de reportar um evento muito rico em conteúdo, que incluiu a discussão sobre as políticas governamentais da esquerda, o trabalho de formação político-ideológica, o estudo das batalhas contra as fake news, a luta democrática não só na América Latina, mas na Europa e nos EUA, a luta pela paz (em uma mesa coordenada pelo presidente do Cebrapaz, Jamil Murad), etc. A cada edição, aumenta o interesse pelo FSP por parte de partidos e organizações de todos os continentes. Em Brasília, por exemplo, estiveram presentes, entre outras, delegações do Partido Comunista da China, do Partido Comunista do Vietnã e do Partido Rússia Unida, do presidente Vladimir Putin, cuja representante defendeu maiores laços com a América Latina e o Caribe na “luta anticolonial e anti-imperialista”. O Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), como partidos anfitriões do 26º FSP, dedicaram grande atenção à construção exitosa do FSP. A secretária-executiva do Foro de São Paulo, Mônica Valente (PT) foi a principal condutora dos trabalhos. Pelo PCdoB, a secretária de relações internacionais, Ana Prestes, Walter Sorrentino (vice-presidente), Adalberto Monteiro (presidente da Fundação Maurício Grabois – FMG) e Ricardo Abreu “Alemão” (responsável pelas iniciativas internacionais da FMG), lideraram a expressiva bancada de militantes comunistas. Todas as resoluções do Foro de São Paulo só valem se aprovadas consensualmente pelos mais de 100 partidos integrantes. Isso exige um verdadeiro trabalho de engenharia política e uma condução comprometida com a unidade. A resolução aprovada reflete de forma avançada os consensos do campo anti-imperialista latino-americano.

26º FSP: Uma resolução avançada

Destacamos alguns pontos da resolução aprovada e remetemos, neste link, para a leitura da íntegra (em espanhol). “Os partidos e movimentos políticos integrantes do Fórum de São Paulo, presentes neste XXVI Encontro em Brasília, Brasil, agradecem aos partidos anfitriões, Partido dos Trabalhadores e Partido Comunista do Brasil, pela organização deste evento transcendental, a primeira grande atividade desde a pandemia de COVID -19, sob o lema ‘Integração regional para promover a soberania latino-americana e caribenha’ (…) Os sindicatos e movimentos sociais brasileiros sofreram forte perseguição com vistas ao seu aniquilamento político. Agora, em 2023, Lula é novamente o Presidente do Brasil e Dilma Rousseff ocupa a Presidência do Novo Banco de Desenvolvimento -conhecido como o Banco dos BRICS-, fatos emblemáticos que dão conta de uma mudança histórica na correlação de forças, reposicionando a esquerda brasileira como protagonista em seu país, e o presidente Lula como protagonista internacional (…) Este Encontro ocorre em um momento em que o mundo enfrenta diversos desafios. O avanço das forças políticas de direita e extrema-direita, as mudanças climáticas, o conflito na Ucrânia, entre outros, são fatos que exigem nosso enfrentamento direto e urgente (…) Nesse contexto, destacamos a necessidade de dar passos firmes rumo à integração regional como um dos eixos centrais de nossa agenda política, econômica e social, com uma visão estratégica ampla e equitativa. Pela integração econômica, pela construção e ampliação de infraestruturas, redes logísticas e energéticas, acreditamos que a região poderá avançar na superação das assimetrias e na eliminação dos efeitos das medidas coercitivas unilaterais impostas pelo governo dos Estados Unidos, que tanto fazem sofrer nossos povos (…) Da mesma forma, a pandemia da COVID-19 demonstrou a necessidade de construirmos também a nossa integração sanitária, que permita a troca de conhecimento científico na área da saúde, bem como a assistência à saúde em tempos de crise, o desenvolvimento e produção de novos medicamentos e vacinas de nosso próprio desenvolvimento científico e farmacológico, reduzindo a dependência externa”.

26º FSP: Uma resolução avançada (continuação)

Mesa da luta sobre a paz, comandada por Jamil Murad, tendo ao lado, de blazer, o conferencista cubano, Elier Ramirez, deputado da Assembleia Nacional do Poder Popular

“(…) As forças neoliberais encontraram na direita – e especialmente na extrema-direita – seu canal de expressão e disputa política. No entanto, as vitórias recentes das forças progressistas e de esquerda na região e as lutas de resistência de nossos povos contra as políticas neoliberais indicam a força das ideias de cooperação, solidariedade e multilateralismo. Nos países onde prevalece a abordagem neoliberal, a desigualdade cresce com a concentração da riqueza de um lado e, do outro, a queda do poder aquisitivo dos salários e o desemprego (…) Cuba resistiu heroicamente por mais de meio século ao bloqueio injusto e criminoso do poder imperial dos Estados Unidos; A dignidade do povo cubano é um exemplo para todas as nações e partidos populares do mundo. A XXVI Reunião da FSP resolve declarar Cuba ‘Patrimônio Universal da Dignidade’ (…) Defendemos o direito dos povos palestino e saarauí a viver livre e plenamente nos seus territórios ancestrais. Conclamamos todos os países do mundo e organizações multilaterais a reconhecerem a soberania dessas nações e a autodeterminação de seus respectivos povos (…) Recordamos os golpes de Estado no Chile e no Uruguai, que há 50 anos consolidaram o avanço das ditaduras militares em nosso continente e têm consequências que ainda estão presentes na vida dos povos chileno e uruguaio, e de todo o continente. A magnífica experiência da Unidade Popular no Chile, liderada por Salvador Allende e interrompida pelo golpe militar de Pinochet em 1973, continua sendo um marco na história dos povos latino-americanos e caribenhos, por sua capacidade de construir a unidade na diversidade, sua compromisso com o povo chileno e com os povos latino-americanos em suas lutas (…) Expressamos nosso apoio a todas as iniciativas em desenvolvimento que buscam uma solução política e diplomática para o conflito na Ucrânia. Rejeitamos as ameaças à paz no Pacífico e as tentativas da OTAN de avançar naquela região”.

Sobre o conceito de democracia

No pouco espaço que a mídia hegemônica dedicou ao 26º Foro de SP, o que predominou foi a crítica à suposta defesa que o encontro faz de “ditadores” e “ditaduras”, com critérios bastante peculiares para definir estes conceitos. Por esses critérios, a França, que nos últimos dias mandou para o xilindró mais de 3.500 cidadãos pelo “crime” de protestar, será eternamente democrática, aconteça o que acontecer, enquanto a classe no poder for a mesma e estiver alinhada ao hegemon. Inclusive, no primeiro dia do FSP, meia dúzia de gatos pingados, seguidores do inelegível, postaram-se em frente ao hotel do evento com faixas expressando as mesmas críticas que depois encontraríamos em reportagens e editoriais da Folha de S. Paulo, de O Globo, do Estadão (este último quase histérico) e de outros da mesma estirpe, revelando como por vezes é tênue a fronteira entre a direita dita civilizada e a extrema-direita boçal. Os liberais burgueses são tão ardorosamente partidários da democracia liberal que apoiaram inúmeras ditaduras implantadas em seu nome. Para citar apenas alguns casos, foi para proteger as “liberdades democráticas” que grande parte das burguesias brasileiras, argentinas, chilenas e uruguaias sustentaram durante muito tempo os seus respectivos regimes de ditaduras militares. Ora, o amor é um sentimento comum à toda a humanidade, mas não é universal, pois não existe uma só forma de amar ou de expressar o amor. De maneira semelhante, é, de fato, impossível pensar em um modelo único, universal, rígido, de democracia. Em um mundo felizmente tão diverso e com peculiaridades nacionais tão acentuadas a construção democrática necessariamente irá assumir, em determinada nação, formas que serão frutos da cultura e da história de cada povo, quer queiram ou não os vetustos editorialistas do Estadão, que sonham com uma “democracia” que seja apenas uma mera formalidade a confirmar no governo a classe que lhe sustenta os anúncios e a cada vez mais raquítica circulação.

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